23 de outubro de 2007

ExecelÊncia vs SIMPlismo

Há, essencialmente, duas formas de levarmos a vida... E passo explicar…
Nós nascemos, não é? Nascemos… Sem nosso mérito, ou culpa. Não é? Pronto...
Mas não somos jogados, ou abandonados no mundo… Há sempre alguém que nos traz! Alguém que, bem ou mal, fácil ou ardorosamente, nos alimenta, nos ensina as primeiras palavras, nos ajuda a dar os primeiros passinhos. Certo? Pelo menos esse alguém existe...

O abandono verdadeiro acontece? Acontece sim, mas só quando nós começamos a tomar as nossas primeiras decisões... Aí, por mais que os nossos pais estejam por perto a ver e a vigiar, as palavras, os passos, os gestos dependem de nós, só de nós, de nós inteiros… Nada, nem ninguém, pode decidir por nós… Podem argumentar muito bem, podem aconselhar, contrariar, convencer, dificultar… mas “não há machado que corte a raiz ao pensamento”. Pois não?... Ele é nosso, só nosso, todo nosso. Isto é aquilo que alguém chamou: “condenação à liberdade”.

Ora, é só nesta liberdade que nós podemos usufruir desse grande e inestimável dom que é a vida. E, no caminho de liberdade em que andamos, há duas formas de levar o dom da vida… Sabem quais são? Pois, exactamente! … Empurrar, ou puxar!
Quem leva a vida empurrando-a, naturalmente, vai atrás dela. Esse carrega com todo o seu peso enfadonhamente, e tem os horizontes limitados aos poucos centímetros que consegue ver entre os seus pés e a vida que empurra… Isto desanima, claro. Por isso, quem empurra, empurra com inacção… Porquê esforçar-se? carpe diem!… Porquê ter 11, quando 10 te chega para passar?…

Quem puxa a vida, por outro lado, vai à frente dela, e de tanto olhar para a frente, para não tropeçar, e para saber por onde vai, alarga os seus horizontes até ao infinito… Isto anima a puxar cada vez com mais ânimo, para ir alcançando o que se vê, o que se deseja e admira; mais um pouquinho disso a que em português se chama "Felicidade".

Puxar envolve pressa, envolve garra… Não basta pensar no dia em que estou, é preciso preparar o de amanhã e o de depois, para que se possa viver dignamente os dias que se passam, isto sem nunca esquecer de preparar os seguintes com mais afinco ainda...
Os grandes homens não se fazem em dois dias, nem com objectivos rurais.

Bem, é aqui que entra o conceito de excelência e de simplismo! Alguém sabe como? Exactamente! ...
A excelência é aquele objectivo, por vezes quase utópico, que nos faz “puxar-mo-nos” para o mais... Para o mais valor… Para o Belo, o Bom, o Bem...
Na vida, quem tudo procura fazer com excelência, pode não ser completamente bem sucedido, mas, sabendo lidar com alguma frustração, será sempre mais…

Já quem faz as coisas só pelo que chega, especialmente quando o que chega é simplista, deixará de ser com o tempo… pura e simplesmente…

Olhemos para os tocantes exemplos de vida daqueles que se eternizaram, e o que é que vemos? Gente em tudo excelente, que não procurou simplismo, mas a radicalidade. Aprendamos de uma vez por todas que só vale a pena colocar desafios e levar o dom da vida que temos a bom porto, se pretendermos chegar um bocadinho mais longe do que o lugar onde estamos!...


E para quem ainda se ilude com o argumento de que a simplicidade é inimiga do excelência, aqui vai uma dica a propósito: "A simplicidade é o que há de mais difícil no mundo: é o último resultado da experiência, a derradeira força do génio!" (G. Sand). Caso para dizer: a simplicidade vem depois da excelência, e nunca rivalizando a par dela.

2 de outubro de 2007

O eRRO de PEssOa



Andava aqui a arrumar o quarto e encontrei o meu livro de Língua Portuguesa do 12º ano. Lembrei-me que o tinha guardado porque queria, um dia, relembrar os poemas que lá vêm, e ver as burrices do género: “ninguém me paga para aturar isto”, que na altura me apeteceu escrever. Passando os olhos pelas páginas de Fernando Pessoa retive-me naquele poema que é o descargo de consciência de todos os estudantes, a saber: aquele que começa por «Ai que prazer Não cumprir um dever, Ter um livro para ler E não o fazer.»

Recordo-me que, neste poema, para além deste desabafo inicial, que muito me apetecia citar quando os professores nos enchem dúzias de papéis com “bibliografia obrigatória e aconselhada”, sempre me atraiu a última quadra («O mais que isto É Jesus Cristo, Que não sabia nada de finanças Nem consta que tivesse biblioteca...»), por desferir o golpe fatal nas bibliografias enfadonhas, usando um exemplo tão profundo.
Contudo, desta feita, como é normal na poesia, o verso «Que não sabia nada de finanças» soou-me estranho, e levou-me a reflectir… Então, Cristo, a pessoa mais inteligente que conheço, não sabia nada de finanças? Nãaa…

Na verdade, os Evangelhos não são, sequer, nada parecidos com um moderno tratado de finanças, pelo contrário, até nos ensinam a não mentir nem roubar! Todavia, o problema não está no evangelho, mas na modernidade dos tratados… É claro que, se entendermos a actividade financeira como a arte de fazer galgar a nossa conta bancária, Jesus não tem nada a dizer. Mas se entendermos a economia como a arte de bem gerir os bens que possuímos (como me parece que consta dos dicionários), aí Cristo ditou-nos um manual fantástico!...

«Perguntavam-Lhe: “Que devemos, então, fazer?” Respondia-lhes: “Quem tem duas túnicas reparta com quem não tem nenhuma, e quem tem mantimentos faça o mesmo.”»

Que nos perdoe Fernando Pessoa, por o termos iludido, confundindo o significado deste termo. Pessoa não errou, foi iludido por aquele que lhe disse o que vem a ser isso de finanças...

[Percebes agora qual é o sentido das Obras Sociais da Igreja?! Cristo não foi economista, mas foi ecónomo, e teria sido um óptimo Ministro das Finanças.]